terça-feira, 23 de outubro de 2012

O Éden Não é o Bastante

Eden is Not Enough: Fin (por Naomi Chen)



Ele era um homem determinado, apesar de quase todos o considerarem um louco pela decisão que tomara. Havia aqueles, poucos, que concordavam com ele, mas não tinham sua coragem para chegar às vidas de fato.

Empunhando apenas sua espada, a única existente naquele mundo de eterna paz e satisfação, forjada nas cavernas do único vulcão que lá existia, ele partiu, rumo às fronteiras de seu mundo.

Lá encontrou exatamente aqueles que esperava: os anjos guerreiros, guardiões da entrada da temível Floresta Devoradora de Almas. Com esforço derrotou-os. Perdeu um braço durante a luta, mas pegou para si, como troféus, os braços direitos dos cinco anjos. Não apenas troféus, mas chaves, que davam acesso aos caminhos secretos para saída.

Porém, o pior estava por vir quando adentrou a floresta. Havia muitos rumores a respeito da criatura que protegia a última barreira entre o seu mundo e o universo lá fora.

As árvores murmuravam mil advertências entre si, todas indiretamente dirigidas ao intrépido desconhecido. Ele ignorou todas e prosseguiu.

Encontrou uma clareira, e em seguida uma cachoeira, onde resolveu lavar suas feridas e matar sua sede. Não deu tempo. Uma explosão de espuma d'água e galopes que soavam como vindos diretamente do inferno interrompeu seu momento de respiro. Ele perdeu o fôlego diante da visão.

Era ela, a criatura, o cavalo demônio de oito patas, o equino anfíbio, com o corpo tatuado com os encantamentos de uma língua mais antiga que o próprio tempo, aqueles que lhe conferiam todo o seu poder. Chifres que eram extensões da árvore da morte. E, é claro, o crânio que tantos diziam ser capaz de romper carne, ossos, tempo e espaço, e sempre atingir fatalmente sua presa, não importava o que ela fizesse.

Ele investiu contra o demônio, que esquivou-se como uma serpente. Foi empurrado em direção a cachoeira, seguido da fera, que mergulhou em seguida.

Foi a vez da fera investir contra ele, que por pouco não teve a barriga rasgada, e os intestinos libertos de seu ventre. Levou a espada para trás, rezou para o seu deus, ele próprio, o único em quem acreditava. A criatura serpenteou, deixando um rastro fervilhante de bolhas. O guerreiro usou seu último fôlego e transferiu toda a sua energia para o único braço que lhe restara. Fechou os olhos, deixando que a espada guiasse suas mãos.

Uma eternidade se passou até que abrisse novamente as janelas de sua alma, e encontrou o que, até momentos atrás, temia ser impossível. O crânio inerte da criatura pendia no alto de seu punho, trespassado pela lâmina da espada. Era surpreendente que ele a derrotara tão facilmente. Pensou consigo se tudo que era preciso para sair daquele mundo era só um bocado de vontade acima do normal. E ali estava a resposta, atravessada por sua espada.

De alma e corpo lavados, e o crânio da besta jogado nas costas, ele prosseguiu. Caminhou o que lhe pareceu mil dias por uma floresta cada vez mais silenciosa e desprovida de vida. À frente a escuridão aumentava.

Chegou num amontoado de arbustos, onde julgou ser o fim da floresta. Seu sorriso de satisfação brilhava como o big bang. Largou espada, braços angelicais e a cabeça da criatura ao chão, e correu até eles. Abriu caminho entre as folhas, e estancou. Ali, diante dele, estava o que procurava. Mas era inquietante demais. Não era o que ele esperava.

Havia, sim, um universo inteiro lá fora, esperando para ser explorado por aquele a quem o Éden não era o bastante. Mas havia, entre o guerreiro e o universo, um abismo de nada. Um salto que ele ainda não era capaz de dar, até o próximo mundo. E então ele entendeu as advertências, as acusações de loucura. Não podia voltar para trás, pois o que deixara quando partiu era pouco para ele, diante da visão à frente. Entre o Éden e o abismo, ele preferia o que estava a um passo de avanço. E o passo ele deu...